Textiverso Cecília B.

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"Whether it be the Soul itself, or God in the Soul, that shines by Lov, or both, it is difficult to tell: but certainly the Lov of the Soul is the sweetest Thing in the world." (Thomas Traherne, Centuries 4:83).

Sunday, June 27, 2010

«Reality my Thought Inspires»

Centuries pode ler-se como uma obra de encaminhamento espiritual e como a resposta de Traherne a uma premência de comungar com o outro «o que esteve escondido em Deus desde o início do mundo». O "outro" será a amiga («the friend of my best Friend») a quem a dedica e, agora que todos o podem ler, será aquele ou aquela para quem, já na altura, desejava, «ser uma bênção». Transcrevo um passo em que o verbaliza, falando de si na terceira pessoa:

4: 32
(...) «But he so desired to lov them, and to be a Joy unto them, that he protested often, that He could never Enjoy Himself, but as He was enjoyed of others, and that above all Delights in all Worlds, he desired to be a Joy and Blessing to others.


E assim é agora que, à semelhança de Jesus Cristo, pode verdadeiramente - e tal como o ansiava poder fazê-lo em vida - dar-se a cada um em plenitude como se só ele / ela existisse. A medida depende agora da capacidade que cada um tiver de o conter: «consoante a vasilha assim o vinho» (observa Angelus Silesius, seu contemporâneo de então).

Se é a própria experiência pessoal de Traherne que lhe dita a escrita de Centuries, esta, mais do que lha recorda, dá-lha a (re)viver numa forma mais discernida e não menos deslumbrante. Já num poema explicitara esta fulgurante tomada de consciência:

«What Newness once suggested to,
Now clearer Reason doth improv, my View:
By Novelty my Soul was taught
At first; but now Reality my Thought
Inspires: And I
With clarity
Both ways instructed am; by Sense
Experience, Reason, and Intelligence.»
(“Right Apprehension”, vs 33-36).

Tanto a visão iluminada como a luz que a ilumina são olhadas como dádivas divinas e, se suscitaram os Poemas, são em Centuries colocadas não só como via para a Felicidade, mas como sendo já essa Felicidade neste mundo, pois que oferecida no agora:

«And by what Steps and Degrees I proceeded to that Enjoyment of all Eternity which now I possess I will likewise shew you. A Clear, and familiar Light it may prove unto you.»
(C 3: 6, linhas 10-12)

Ao longo de toda a sua obra, em prosa como em verso, Traherne reitera esta verdade de a «Felicidade» - e «Felicity» não é a banal "happiness" - ser oferecida no agora para ser fruída («enjoyed») já: «He offereth it (Felicity) now» (C 4: 9, linha 20)

Thursday, June 10, 2010

Highest Bliss

É um leitmotiv a percorrer toda a escrita de Traherne o princípio de que gozar (enjoy) plenamente o mundo, gozar no mais pleno entendimento do significado etimológico do termo "gozo" (do latim gaudium, subjacente a joy, por via do francês antigo, joïe) é retribuir a Deus a Sua dádiva acrescida do que a faz infinitamente mais grata aos Seus olhos do que quando a criou. É possível reconhecer em tudo isto uma glosa a Rom. 8; no entanto, os ecos biblícos mais parecem ter sido convocados pela experiência do que terem-na suscitado, facto frequentemente observável com respeito a outros ecos e reverberações da Bíblia despertados ao longo de Centuries e nos Poemas. Tal é um dos traços que singularizam Traherne entre os seus contemporâneos conhecidos como “metafísicos” (mesmo em relação a Herbert e Vaughan, com quem têm sido encontrados pontos de aproximação, Traherne sobressai pela singularidade de uma escrita indissociável da vida).
Na continuidade da visão holística da primeira infância, que preservou na memória, na visão iluminada pela "razão suprema" que agora tem, Trahern, nas Centúrias, desperta na sua enunciatária a consciência de que é herdeira do mundo, não porque assim o proclame o texto paulino, mas porque aquele “algo de grande”, cuja força de atracção toma como experiência partilhada (C 1: 2), lho revela: “Is it not a very Enriching Veritie?” (C 1: 3). Tal sendo a verdade oculta desde o início dos tempos (cf. C 1: 3), comunicar-lha será o mais sublime testemunho de amor (cf. C 1: 6). Tal é o início de uma linha de desenvolvimento temático em que Traherne continua, ao longo de toda uma série de parágrafos, a colocar a fruição plena de todas as coisas como condição sine qua non do conhecimento de Deus e do Seu amor, conhecimento com que relaciona identificativamente “a vida eterna” (cf. C 1: 17 – “To know GOD is Life Eternal”).


Transcrevo a abertura do prólogo ("The Author to the Critical Peruser") dos "Poemas":

The naked Truth in many faces shewn,
Whose inward Beauties very few hav known,
A Simple Light, transparent Words, a Strain
That lowly creeps, yet maketh Mountains plain,
Brings down the highest Mysteries to sense
And keeps them there; that is Our Excellence:
At that we aim; to th' end thy Soul might see
With open Eys thy Great Felicity,
Its Objects view, and trace the glorious Way
Wherby thou may'st thy Highest Bliss enjoy.


Arrisco uma tradução:

A Verdade nua em muitas faces mostrada,
conhecidas de be
m poucos as belezas que contém,
uma luz simples, palavras transparentes, uma força
que corre profunda, mas torna planícies as montanhas,
os mais altos mistérios faz descer à consciência

e aí os sustenta; tal é a nossa excelência:
tal é o que visamos; a fim de que a tua alma veja
de olhos abertos a tua Felicidade imensa,
observe os seus objectos e trace a via gloriosa
p’la qual fruas a tua ventura mais ditosa.